terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Entre o saber popular e o saber científico: um caminho a percorrer

A hortelã: usos e benefícios

“Observar não é, pois, uma atividade prévia à teoria; não é uma coleta aleatória de dados esparsos. É, antes, uma forma de olhar os fenômenos interrogando-os.” http://timfazciencia.com.br/observar/

A atividade teve início no Canto de São Francisco, um espaço ambiental criado na escola. Ao longo do semestre, estamos desenvolvendo um projeto sobre os chás medicinais. Levamos para o espaço um caça-vegetal, com pistas para que pudessem descobrir, entre outras, através dos sentidos a erva hortelã. Após a abertura de uma caixa, cujo conteúdo era o envelope que continha o jogo, conversamos sobre o assunto:


Prof: “Como poderemos achar esse vegetal?”
Catharina: “Ouvindo as dicas e procurando.”
Prof: “Com quais partes do nosso corpo?”
Catharina: “Com o olfato podemos sentir o cheiro.”
A partir da fala de Catharina, compreendi que ela já sabia a respeito dos sentidos. Mas, precisava verificar se esse era um conhecimento dela ou da turma.
Prof. “E o que mais?”
Maria Eduarda: “Podemos ver com os olhos.”
Prof: E como chama esse sentido?
Todos: “Visão!!!”
Thifany: “E pode sentir comendo”
Prof: “Esse é o paladar. Mas eu posso sentir com o tato.  Qual a parte do corpo?”
Camily: “É com a mão.”
Prof: “Mas eu só sinto com a mão? E se passar alguma coisa no meu braço ou na minha perna, eu sinto?
Joaquim: “É com a pele.”
Prof: “Então nós vamos ler as dicas, mas vamos combinar que, neste momento,  só usaremos a visão.”
Uma a uma, as pistas iam sendo sorteadas e alguma criança era escolhida para procurar a planta somente através da visão a partir da dica, que correspondia à característica do vegetal.



As pistas:

 É uma planta rasteira.
 A altura pode variar de acordo com a espécie.
Tem sabor de menta.
Tem alturas variadas: de 15 cm a 1 metro de altura.
Suas flores são pequenas e de cor violeta.
As folhas são ovaladas.
Tem sabor refrescante.
Possui folhas verdes.
As folhas são rugosas.
Suas folhas são aromáticas.

Algumas dicas não ajudavam muito a identificação, pois poderiam corresponder a qualquer planta e necessitavam de um conhecimento maior por parte dos alunos, mas eu tinha a certeza de que três dicas seriam muito boas para a identificação do vegetal:
Tem sabor de menta.
Tem sabor refrescante.
Suas folhas são aromáticas.






Quando essas dicas foram sorteadas, Sophia e Júlia logo acertaram. Joaquim, não contendo sua ansiedade, foi logo dizendo: “É a hortelã!”
Prof: “Bem, então já que vocês acertaram, utilizando somente a observação e as pistas, vamos conhecer a planta através do olfato?”
João: “Tem cheiro de pasta de dente.”
Kauã: “Parece bala!”
                                                      Maria Eduarda: “Hum... Que cheiro bom!”


Depois que todos sentiram o cheiro da hortelã, propus que os alunos observassem a planta e que a  tocassem.
Maria Luiza: “A folha tem risquinhos e tem as pontas não são lisas.”
A essa altura, todos já estavam querendo provar. Quando perguntei quem gostaria de provar a folha, todos levantaram o braço. Quando o primeiro aluno provou e disse que era bom, foi mais empolgante ainda. Todas as crianças provaram. Apenas duas disseram que não gostaram.
Perguntei o que a turma sabia sobre aquela planta. As respostas foram as seguintes:
“Tem o mesmo gosto e cheiro da pasta de dente.”
“É igual a bala de hortelã.”
“Pode usar nas saladas. “
“Pode fazer suco.”
“Serve para dor de barriga.”
“Tem cheiro bom.”







Levei um exemplar para a sala para que pudéssemos analisar melhor.
Verificamos que quando a planta é nova e pequena, o caule é fino e verde. As folhas são pequenas. Quando o vegetal cresce mais, o caule é mais grosso e possui a cor arroxeada.
Os alunos não conheciam muito os seus benefícios e também não sabiam dizer se os familiares a utilizavam.
Sendo assim, propus que levassem uma pesquisa para casa para descobrirem tais informações.
Propus desenhos sobre o vegetal para utilizarmos posteriormente no mural que iríamos construir.










Li a pesquisa juntamente com os alunos para que se apropriassem das questões que estariam levando para casa e expliquei-os sobre como deveriam proceder ao fazerem as perguntas aos familiares, com perguntas simples do tipo: “Nós utilizamos a hortelã aqui em casa?”

Todas as crianças levaram os questionários (anexo 1), porém tivemos contratempos, pois algumas crianças não os trouxeram para a escola no dia seguinte. Expliquei ao grupo que precisávamos das respostas de todos os alunos, pois a fonte de pesquisa eram os alunos da turma, portanto, todos deveriam participar. Depois de várias tentativas e de novas cópias distribuídas, conseguimos a totalidade de questionários respondidos para que iniciássemos o processo de análise dos dados obtidos.

Com os questionários em mãos, verificamos se haviam 35 questionários para nos certificar que todos os questionários haviam retornado. Conversei com as crianças, explicando que trabalharíamos com as informações em partes.

Retomamos a primeira questão: “A família utiliza a hortelã?” Todos queriam falar sobre o assunto. Combinamos que todos falariam e decidimos seguir a ordem dos questionários. Conforme fui chamando cada criança, esta ia respondendo se a hortelã era utilizada ou não. A partir daí, fomos marcando cada resposta para verificarmos, no final, a quantidade exata de respostas afirmativas e negativas.

Com as quantidades verificadas, completamos uma tabela para ser a base de informações e partimos para a elaboração do gráfico de barras. Como a turma já tinha participado de outras elaborações de gráficos, sua construção foi mais fácil.




Prof: “Como podemos fazer o gráfico?”
Joaquim: “Verificamos na tabela quantas respostas ‘sim’ e quantas ‘não’. Depois pintamos ou colamos o ‘quadradinho’ no gráfico dessa mesma quantidade.”
Thifany: “Tem que colocar o título em cima.”
Prof: “E onde fica a fonte de pesquisa?”
Todos: “Embaixo.”






Elaboramos, a partir da pesquisa realizada pelas crianças com os familiares, uma lista com a utilização da hortelã. Muitos já haviam incorporado as respostas do questionário e diziam com propriedade as formas de utilização da hortelã em suas casas. Resolvemos que cada criança explicaria como essa utilização se dava e, de vez em quando, ouvíamos algumas crianças dizendo: “Na minha casa também!” Fomos listando as utilizações no quadro e verificamos usos variados. Classificamos os usos em “ALIMENTAÇÃO” e “USO MEDICINAL”. Foi importante, pois nem todas as crianças conheciam, por exemplo, a utilização da hortelã como tempero para carne na preparação de quibes. O uso da hortelã na elaboração de sucos e chás eram as mais conhecidas. Essa atividade foi disparadora para a comparação das respostas dos familiares com as respostas das crianças no início da sequência didática:

 “É igual a bala de hortelã.”
“Pode usar nas saladas. “
“Pode fazer suco.”
“Serve para dor de barriga.”

Dessa forma, valorizamos os conhecimentos prévios trazidos pelas crianças, porém ampliamos o campo de informações, como cita uma criança: “Eu não sabia que hortelã era um tempero.”










Prof: Como é a utilização da hortelã nas famílias do 1° ano?
As crianças foram falando muito entusiasmadas sobre o que já dominavam: “Usamos para fazer chá.” “Para temperar e fazer sucos.” “Tem família que não usa.”
Partimos para a elaboração da tabela sobre a utilização. Elencamos as quatro possibilidades a partir das respostas: USO MEDICINAL, ALIMENTAÇÃO, OS DOIS E NENHUMA UTILIZAÇÃO.
 Lemos as respostas de cada criança e fomos anotando os resultados. Se a resposta de uma criança fosse tempero, marcávamos um traço para alimentação. Dessa forma, ao terminarmos a leitura de todos os questionários, tínhamos a quantidade exata de cada item que foi anotado em uma tabela e por meio dessas informações obtidas, tínhamos os dados para elaborar o gráfico de barras.

É interessante ressaltar que essas atividades foram realizadas coletivamente com o objetivo de produzir material para o mural da sala de aula, entretanto, cada criança também produziu suas tabelas e gráficos no caderno de matemática.

Elaboramos, a partir dos questionários, uma lista de benefícios trazidos pela hortelã, nossa última questão da pesquisa realizada com as famílias.

Prof: “Como os familiares responderam essa questão?”
Cauã: “Minha mãe já sabia.”
Catharina: “A minha mãe pesquisou na internet”
Prof: “Como podemos saber se todas essas respostas estão certas? Se a hortelã serve mesmo para tudo isso?”
Catharina: “Tem que pesquisar para ter certeza.”
Julia: “Nem tudo o que as pessoas dizem é verdade.”

“Verificar é, portanto, se dispor a examinar a veracidade de um enunciado ou alegação, buscar uma forma de se certificar que algo é verdadeiro ou que funciona tal como esperado. Isso implica, portanto, uma atitude e uma disposição não só para questionar algo, mas para desenvolver formas de verificação.” http://timfazciencia.com.br/verificar/

Aproveitei a fala de Júlia para fazer a distinção entre o saber popular e o conhecimento científico:
Prof: “Como é que chama quando um conhecimento vai passando de geração em geração?”
Camily: “Cultura popular.”
Prof: “Isso! Alguns conhecimentos fazem parte da tradição, quando vai passando de uma pessoa para outra através da oralidade.”
Então, como a Catharina disse, precisamos pesquisar para ter certeza se a hortelã traz todos esses benefícios.



Em outra situação, como leitura do dia, trouxe um texto informativo sobre a hortelã. Por meio desse texto, tivemos a oportunidade de ir verificando e nos certificando de alguns benefícios escritos na lista, porém, nem todos foram contemplados.  Fomos colando no cartaz, uma mãozinha (sinal de positivo), para os benefícios que foram pesquisados.

No final da atividade, percebemos que alguns benefícios citados pelos pais não haviam sido marcados, pois não constavam no texto informativo. Vimos a necessidade de fazer novas pesquisas.


Na sala de informática, utilizamos o site de busca “GOOGLE” para fazer uma pesquisa digitando “benefícios da hortelã”. Utilizamos o site http://www.saudedica.com.br/hortela/

Convidei os alunos a lerem as informações contidas no site e eles foram confirmando informações já conhecidas, além de descobrirem  novos benefícios. Conforme as crianças iam falando os benefícios já conhecidos ou novos, fomos escrevendo no quadro para formar uma nova lista que seria retomada posteriormente em sala de aula, para a escrita no caderno e de uma nova listagem para o mural da sala com o conhecimento pesquisado.

“A verificação é fruto não simplesmente de uma técnica ou hábito, mas de uma disposição: a de buscar formas de comprovação daquilo que se crê ser verdadeiro, válido ou eficaz.” http://timfazciencia.com.br/verificar/
  
Em sala de aula,  lemos uma receita de chá de hortelã para que as crianças pudessem compreender seu modo de preparo, além de preencher a ficha da erva.

Finalmente, preenchemos a ficha da hortelã com os seguintes itens:

NOME
UTILIDADE
MODO DE PREPARO
CURIOSIDADE



 “Perguntar e responder são nossas ferramentas intelectuais mais importantes. As respostas que temos em nossas cabeças não significam nada a menos que saibamos as perguntas que as produziram. Uma pergunta é um tipo de oração. Mal formulada, não produz conhecimentos ou compreensão. Bem formulada, leva-nos a novos fatos, novas perspectivas, novas ideias.” http://timfazciencia.com.br/questionar/




O desenvolvimento desse trabalho foi muito prazeroso. Tanto para mim, quanto para as crianças. Levantar questões pertinentes, fazendo intervenções pontuais e relacionadas ao cotidiano da criança é muito interessante, pois os alunos se interessam de imediato. Além disso, criar atividades que culminarão em produtos que reverberarão de forma positiva e utilitária para a comunidade em que as crianças vivem é fundamental para uma educação que produz desenvolvimento.

Essa experiência foi publicada no "Caderno Metodológico" organizado pela Equipe Pedagógica da Secretaria Municipal de Petrópolis.

Ana Antunes








2 comentários:

  1. Muito bom conhecer suas práticas!!!! Aprendendo sempre com vc!!!

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    1. Obrigada Tatiana!
      Fui na sua sala no dia da eleição e me vi muito lá! fiquei feliz! Que bom poder compartilhar ideias com as pessoas e saber que elas aproveitam e colocam pra frente! Muito obrigada!
      Bjs,
      Ana

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