Você conhece os "tangolomangos"? Eu não conhecia, mas fui apresentada pela Lica (uma professora muito especial e muito motivadora que possui o blog http://oficinasdealfabetizacao.blogspot.com No blog dela eu aprendi muitas coisas sobre esse texto de tradição oral e gostei de cara!!
Depois de um tempo, Lica disse-me que escreveria um artigo para o "Caderno 5" do Pnaic e que precisaria de um relato de experiência interdisciplinar que tivesse como base o tangolomango.
Tive medo! Rsrsrsrs!!!!! Fiz o meu melhor!! Aqui nesse registro você poderá conhecer o trabalho desenvolvido na íntegra.
Registro:
O
trabalho teve início na Casa de Leitura onde começamos a conversar sobre o
final de semana. Emanuel cortara o dedo e estava com um grande curativo. Todos queriam saber o que havia
acontecido. Ele explicou que havia
prendido o dedo na porta e acabou se cortando. Sarah também quis mostrar seu
machucado no braço. Willian também ferira o pé. Foi um festival de machucados.
Até quem não tinha, já queria arrumar algum para mostrar. Será Tangolomango?
Propus um telefone sem fio. Todos adoram! A
palavra escolhida foi TANGOLOMANGO. Kethlen, a primeira criança, pediu que eu
repetisse, pois não entendera nada! Repeti pausadamente TAN-GO-LO-MAN-GO. A
brincadeira começou e só se viam caras de espanto: “O quê? Repete!” Cada
criança foi passando para a outra o que havia compreendido, mas com a grande
desconfiança de que aquilo não deveria estar muito certo. Finalmente, a
brincadeira chegara à última criança e a
palavra dita foi .... BALÃO! Kethlen foi logo dizendo: “Não foi nada disso! Era
uma outra palavra!” Mas, não sabia explicar para os colegas, pois já havia
esquecido. Disse que era uma “coisa” muito diferente e que não lembrava.
Emanuel pediu que eu dissesse a palavra correta. Fui logo dizendo:
“Tangolomango!” E a uma só voz, só se ouvia: “O que é que é isso?” Ninguém nunca
ouvira aquela palavra antes. Pedi que dissessem o que deveria ser o significado
dela. Alguns disseram fruta, outros, balão. A palavra era tão diferente que
ninguém se arriscava a dar palpites. Começaram a perguntar o que era. Eu disse
que iria contar um tangolomango que eu havia conhecido e que lembrava a própria
história vivida por eles no final de semana. Era o tangolomango das nove irmãs.
Assim que comecei a falar, logo começaram a interagir com o texto. E foi
bastante interessante observar como as crianças se mostraram envolvidas por
aquele texto caracterizado por repetições.
Ao final da contação, pude perceber o entusiasmo de todos, manifestado
quando disse: “ACABOU A GERAÇÃO”. Intensificado, com alegria, ao falarem em
coro: “DEU TANGOLOMANGO NELA”.
Kethlen: É um susto
ou um tombo!
Thierry: É sumir,
desaparecer!
Emanuel: É uma
confusão!
Leonardo: Foi dando
uma coisa na cabeça delas!
Emanuel: Eu acho
que é quando acontece algum problema! Quando dá alguma coisa errada!
Leonardo: É porque
elas sumiram!
Thierry: É porque acabou a geração! Não tem mais
ninguém!
Quando
meus alunos pedem para repetir é porque realmente gostaram e eu tive que
repetir algumas vezes, pois eles queriam participar. Penso que todas as
crianças são assim.
Heloisa
disse que as palavras rimavam e que achou muito legal. Fomos pensando em quais
eram as rimas daquele tangolomango: oito/biscoito, sete/canivete, seis/inglês,
cinco/pinto, quatro/teatro, três/francês, duas/ruas, uma/alguma,
feijão/geração. Trabalhamos as rimas no campo da oralidade sem o compromisso
com o escrito e todos participaram animadamente. A turma já possui um histórico
de trabalho com rimas e esse tipo de atividade, além de motivadora é sempre enriquecedora
para as crianças, pois levam os alunos a desenvolverem a consciência fonêmica,
reconhecerem padrões e isso facilita o aprendizado da linguagem. Ampliamos as
rimas presentes no tangolomango: dezoito, Ivete, marquês, minto, cinto, luas,
pluma, espuma.
Conversei
com a turma e sugeri que perguntassem em casa se alguém conhecia algum
tangolomango. E propus que levassem o Tangolomango das nove irmãs para ler em
casa. Um grupo de crianças tinha o objetivo de ler para os pais e outro grupo
de ler junto aos pais. Dessa forma, a atividade atenderia à necessidade de cada
criança, pois nem todos leem convencionalmente, entretanto todos possuem suas
hipóteses de leitura. Além disso, deveriam pesquisar junto aos familiares se
conheciam os tangolomangos.
No
dia seguinte, todos disseram ter lido para/ou com os pais, entretanto, ninguém
conhecia aquele gênero. Sarah disse que sua mãe pesquisara na Internet e descobrira
que era uma música. Fomos para a Internet pesquisar e achamos o Tangolomango
das nove irmãs, cantada pela Bia Bedran. Ouvimos e eles cantaram, pois já
conheciam o texto de cor. Vimos que esse gênero também pode ser cantado.
Li
para eles o Tangolomango das bruxas e as crianças acharam muito divertido,
comparando-o com o Tangolomango das nove irmãs, percebendo, assim, que há
algumas rimas iguais e outras diferentes. Aquele texto também foi levado para casa pelos
alunos, para que os familiares o conhecessem. Dessa vez, entretanto, pedi que
alguém da família dinamizasse a leitura de alguns trechos e a criança outros. E
assim, a cada tangolomango que conheciam, levavam para compartilhar e interagir
com a família.
Para
fomentar a ideia de tradição oral, solicitei que ouvissem com bastante atenção,
a versão “As nove filhas” de José Mauro Brant, pois após a leitura gostaria de
ouvir alguns comentários. Todos ouviram com atenção e fiquei surpresa com as
observações, pois fizeram comparações com o tangolomango “Nove irmãs em uma
casa” e o “Tangolomango das bruxas”:
Gabriel Ferreira:
Nos dois tangolomangos aparece a mesma quantidade de pessoas.
Emanuel: O da bruxa
tem 10.
Ana: Vocês sabiam
que o número nove sempre foi considerado como um número de mistério?
Ana Carolina: Tem
muito mistério nessas histórias!
Maria Cecília: Os
dois terminam com acabou a geração.
Heloisa: Todos eles
têm rimas.
Pedro: O primeiro,
das irmãs na casa, cada uma vai fazer alguma coisa sozinha. No segundo, das nove filhas, todas vão juntas,
mas o tangolomango só acontece com uma delas!
Ana: Nossa, Pedro,
adorei essa observação!
Thierry: Tem coisa
que é igual e tem coisa que é diferente: uma come feijão e a outra faz feijão.
Ana: Por que será
que esses textos são tão parecidos?
Gabriel Ferreira:
Cada um conta de um jeito.
Melissa: Ah, então
é o conto popular, igual ao da Galinha Ruiva.
Ana: Isso, gente, é
a mesma idéia! Por que chamamos alguns textos de contos populares?
Leonardo: Porque
não tem autor, é popular.
Ana: E o que
significa isso?
Kethlen: É que todo
mundo conta e aí as histórias saem diferentes.
Ana: Isso. Dizemos
que passa de boca em boca. Eu posso pegar a história do povo e dizer que essa
história é minha?
Todos: Não!
Heloisa: Só se
mudar algumas coisas, como “A galinha Xadrez”!
Ana: Isso mesmo.
Esses tangolomangos fazem parte da cultura do nosso povo. Tem alguns autores
que gostam de brincar com esse tipo de texto. Eu vou trazer alguns deles para
vocês em outro momento.
Com
o primeiro tangolomango, “Nove irmãs numa casa”, cujo conteúdo já sabiam de
cor, propus algumas atividades. A primeira delas foi o reconhecimento de palavras
no texto. Algumas crianças, com hipóteses de escrita silábico-alfabéticas e
alfabéticas fizeram sozinhas; já as silábicas e pré-silábicas, que atualmente
correspondem a 6 crianças, fizeram em duplas. O objetivo era circular as
palavras que correspondiam às rimas do tangolomango. Após esse trabalho, as
crianças procuraram os numerais que apareciam por extenso, em ordem
decrescente. Durante a atividade fui circulando pela sala para auxiliar os
alunos. Ao notar alguma dificuldade, ia perguntando para a turma: “Que dicas
podemos dar para o amigo conseguir achar essa palavra? Com que letra começa?
Essa palavra tem algum acento? Qual?”
Também
propus uma atividade em duplas ou trios, cujo objetivo era a ordenação de dois
versos. As palavras estavam embaralhadas dentro de um envelope. Eles precisavam
ordená-las para montar os versos corretamente. Ao passar pelos grupos fui
fazendo intervenções. Pedia que lessem o que já haviam construído e perguntava
qual era a próxima palavra, com que letra começava ou terminava... Ao concluírem,
fomos montando o cartaz com o tangolomango: “Qual grupo virá primeiro? Qual
grupo será o próximo?” Aquele cartaz servirá de apoio em sala de aula, onde
poderão ler, ajustando partes do falado ao escrito ou buscar referências para a
escrita das mesmas ou de outras que possuam o mesmo som.
Como atividade de
escrita, propus o texto lacunado. As duplas que necessitavam de mais ajuda
trabalharam com o banco de palavras, o que não ocorreu com os mais autônomos.
Fui lendo o tangolomango e parando nas lacunas. Eles falavam a palavra que
deveria estar escrita e completavam. Em alguns momentos, como na escrita da
palavra FRANCÊS, propus uma reflexão coletiva para a escrita, pois várias
hipóteses surgiram, mas que foram sendo eliminadas através das falas das
crianças. Entretanto, a última palavra foi dada pelos alunos que tinham o banco
de palavras. Isso os estimulou, pois tinham a forma correta em suas folhas e
participaram ativamente da busca.
Em
outra atividade distribui uma cartela com as rimas presente no tangolomango.
Tanto as crianças que trabalhavam sozinhas quanto as duplas procuraram a dupla
de palavras e usaram uma mesma cor para pintá-las. Ao terminarem, recortaram e
colaram as duplas de palavras no caderno.
Nesse
dia também jogamos o jogo da rima, do material Trilhas, presente em nossa sala
de aula, o que proporcionou novas possibilidades de ampliarmos o repertório.
Uma outra proposta também
foi desenvolvida em duplas. Cada uma
delas recebeu o tangolomango em tiras, para recortar e ordenar. Era uma
proposta, para mim, ousada, mas as duplas foram bem estudadas e certamente
seria uma boa oportunidade para ler e ajustar o falado ao escrito. Foi
interessante, pois a dupla de Thierry e Pedro, após cortarem as tiras,
separaram-nas em ERAM E DEU, ou seja, todas as tiras que começavam com a
palavra ERAM ficaram com Thierry e todas as tiras que começavam com DEU ficaram
com Pedro. Eles iam recitando e procurando. Quando observei que eles tinham
pensado nessa estratégia, pedi que todos parassem para que eles explicassem o
que haviam feito. Todos acharam uma boa ideia e começaram a fazer o mesmo.
Dessa forma foi mais fácil ordenar todas as tiras. As rimas no final de cada
verso serviram como disparador para que as crianças logo identificassem as
tiras corretas. Após a colagem do tangolomango, pensamos na escrita do título
Tangolomango. Refletimos como essa palavra é grande e com muitas letras,
entretanto já era familiar para eles e não tiveram dificuldades em escrevê-la.
Como temos muitos cartazes com o mesmo tangolomango, escreveremos uma carta
para todas as turmas explicando um pouco sobre o tangolomango e deixaremos um
cartaz em cada sala. Dessa forma, estaremos ampliando o conhecimento desse
gênero aos outros alunos da escola e também trará uma função para os cartazes
que fizemos.
Em
outro dia, retomamos a ideia do que era um tangolomango. As
crianças disseram que era um texto que rimava e que até poderia ser cantado.
Era uma história contada pelas pessoas. Leonardo muito esperto, disse que
parecia com uma parlenda e Gabriel afirmou que era um texto muito misterioso.
Relembramos a ideia de que alguns autores também
brincam de tangolomango em suas publicações. Mostrei o livro Chá das dez, de
Celso Sisto. Quando mostrei a capa do
livro, pedi que me ajudassem a ler o título. Ao lerem, algumas crianças
começaram a perguntar: “É tangolomango?” Perguntei por que estavam perguntando
isso e eles responderam porque tinha a palavra dez e apareciam dez velhinhas,
logo deveria ser um tangolomango. Percebi logo que eles já estão conhecendo as
características do gênero. Os alunos gostaram muito do livro e, página a
página, foram observando e comentando as suas ilustrações. Cada velhinha era de
um jeito diferente, mas eles ficaram muito curiosos em saber o que iria
acontecer com cada uma delas. Os quitutes enumerados também eram motivo de
interesse e ficaram procurando cada um deles nas ilustrações. O rocambole
holandês foi o mais admirado. No livro, diferente dos outros textos já
trabalhados, as velhinhas voltavam e isso gerou motivo de conversa entre eles. Também
observaram que a palavra tangolomango não aparece. Questionei se o texto era
então um tangolomango. Eles afirmaram categoricamente, pois as velhinhas vão
saindo da história, pois algo lhes acontece. Trabalhamos oralmente muitos
aspectos do texto e as crianças pediram para desenhar. Eu não havia planejado
tal situação, mas permiti que o fizessem. Foi interessante, pois quiseram ver
novamente as ilustrações. Emanuel ficou impressionado com o tamanho dos queixos
ou dos narizes de algumas. Foram muitos risos!
Em
comparação, vimos que o “Tangolomango das bruxas” também tinha dez personagens,
assim como as velhinhas do “Chá das dez”. Refletimos sobre
o Sistema de Numeração Decimal e em nossa sala desenvolvemos várias
atividades com o material dourado, com palitos e até mesmo durante a exploração
do calendário. Assim, aproveitei a numeração presente no tangolomango para
pensarmos no jogo Nunca 10, pois, afinal, nunca temos 10 velhinhas para o chá. Uma a uma vão
saindo e, no jogo, uma a uma vão formando a dezena exata. No jogo, ao
contrário, necessitamos juntar 10 unidades para trocar por uma barra que
equivale a uma dezena. Solicitei a ajuda de uma dupla para que eu pudesse explicar
o jogo para toda a turma. Após a primeira rodada com a dupla, pedi que outras
crianças explicassem os procedimentos. Como todos já estavam compreendendo,
distribui as peças para os outros grupos. Todos jogaram animadamente. Em cada
grupo havia um banqueiro que auxiliava na troca das unidades pelas dezenas.
Após o jogo, solicitei que fizessem um registro que mostrasse como se jogava o
Nunca 10. Expliquei que poderiam valer-se de desenho, escrita, ou o que
pensassem de diferente. Os registros ficaram muito interessantes e foram
compartilhados no momento da roda de conversas. Fizemos uma comparação entre o
jogo e o tangolomango. Gabriel Ferreira disse: “As velhinhas vão sumindo e aqui
no jogo também nunca pode ficar 10!” E Francisco: “No tangolomango os números
diminuem e aqui no jogo os números aumentam.”
Também li outros tangolomangos para as
crianças que podem servir como novas opções: “Dez sacizinhos”, de Tatiana Belinky e “Dez patinhos”, de
Graça Lima, “A casa das dez furunfunfelhas”, de
Lenice Gomes e “Dez monstrinhos”, da Editora Lafonte.
Apresentação do Tangolomango das bruxas para as outras turmas:
Criação de jogo da memória do livro "Chá das dez":
Kit Chá da dez:
As crianças criaram os desenhos para o jogo da memória que consiste em emparelhar o quitute com o seu respectivo nome.
Eu montei ainda outra proposta. Letras móveis para formar cada parte do tangolomango. Um pra cada velha!!!!
Tangolomango
Propostas com tangolomangos
Espero que tenham gostado! Até a próxima!
Ana Antunes
Amei as dicas! Parabéns!
ResponderExcluirObrigada, Rosana!
ExcluirBem vinda!
Os comentários nos ajudam sempre.
Um abraço,
Ana
Oxente! Eu comentei e sumiu!!!
ResponderExcluirVai de novo!
Aninha! Muito bom ler o relato completo, muito lindo, pena que lá no texto do PNAIC não dava pra colocar esse registro todo.
mas que bom que você postou!
Vida longa aos tangolomangos! Vida longa às invencionices com as crianças!
Bjos, querida,
Lica
Santé!!!!!!
ResponderExcluirMuito bom! Depois de conhecê-los, não saíram mais da minha sala! Gosto muito e as crianças também.
Obrigada pela nossa parceria e pela confiança.
Beijo grande!
Ana
Legal esse tangolomango todo! Parabéns!
ResponderExcluirObrigada Ka!
ExcluirBem vinda!
E acabou a geração! Rsrsrs
Um abraço,
Ana